domingo, 12 de setembro de 2010

Ruanda, Dilma e outras dúvidas

Recentemente terminei de ler 'Gostaríamos de informá-lo de que amanhã seremos mortos com nossas famílias'. É um ótimo livro, mostrando o trabalho investigativo de um repórter depois do genocídio étnico de 1994 em Ruanda. Conta até a história que acabou virando o filme Hotel Ruanda (mas não sei se o filme foi inspirado diretamente nesse livro).

Uma das coisas que me deixou impressionado é que o autor, descrevendo inúmeros exemplos, mostra que a chamada 'opinião pública internacional' não tinha a mínima ideia do que havia acontecido em Ruanda, muito menos o que seria o melhor a fazer depois do ponto de inflexão que foi o genocídio. E não me refiro ao cidadão José da Silva, que mora em Santana do Parnaíba e se informa pelo Jornal Nacional; o livro demonstra a crônica desinformação (e/ou falta de decência) de chefes de Estado, jornalistas e diplomatas dos países mais poderosos do mundo.

É claro que a imprensa e os Estados em geral são construções falíveis, assim como qualquer instituição humana. O que me incomodou nesse caso é que todos erraram da mesma forma. Não havia divergência de opiniões: fora de Ruanda, a opinião hegemônica era completamente infundada.

Fiquei regurgitando tudo isso e me toquei o quanto é difícil saber em quem confiar. Vejam, por exemplo, os recentes escandalos-relâmpago em torno da candidatura presidencial da Dilma Roussef. Devo confiar na Folha e na Veja* ou devo confiar na palavra dos representantes do Governo e da Receita Federal?

Mas o exemplo é ruim. Imagine um caso em que duas pessoas desconhecidas estão brigando e, vendo você, pedem a sua ajuda, cada uma pra um lado. Claro que a ética comum recomendaria separar a briga; mas imagine que então os dois se acusem mutuamente de assassinato de um familiar, e que você não tenha nenhum telefone próximo. Ambos dizem: 'Ele matou a minha mulher, segure ele e vou chamar a polícia.'

É claro que existe um fundamento, uma verdade; um dos dois está correto, o outro está mentindo. Mas não há um meio prático, objetivo, de identificar a verdade antes de tomar uma atitude. Não há como ir até o Afeganistão e saber pessoalmente qual é o lado 'correto' da guerra (se é que há algum lado correto); temos que escolher, talvez até intuitivamente, em quem confiar. E depois que fazemos a primeira escolha, é muito difícil mudar de lado, mesmo quando confrontados com fatos contrários.

O melhor seria sempre examinar com cuidado as opiniões em conflito e tentar escolher a mais fundamentada. Mas isso, é claro, não é simples. Nem um pouco simples, sem ter acesso aos fatos diretamente.

Bom, nesse post, fico por aqui. Pretendo voltar a escrever mais, como já pretendi muitas vezes. Mas acho que dessa vez é sério.

* - Que mundo estranho é esse que agora coloca Veja e Folha no mesmo barco?