segunda-feira, 19 de abril de 2010

Da pedofilia na igreja

Fiquei intrigado com os mais recentes escândalos envolvendo padres pedófilos na Igreja Católica, tanto na repercussão um pouco excessiva até nas respostas um tanto quanto destrambelhadas. Vi em alguns blogs uma defesa baseada em estatística: segundo um estudo feito nos EUA em 2004, apenas 4% dos padres analisados estariam envolvidos em algum tipo de acusação de atividades sexuais com crianças ou adolescentes. Um psicólogo chamado Thomas Plante fez análises comparativas e afirmou que a incidência de pedofilia entre os padres católicos é basicamente a mesma que atinge a população em geral. Por exemplo, um estudo feito em escolas também norte-americanas revelou que 5% dos professores escolares também apresentavam acusações de envolvimento sexual com crianças ou adolescentes. Olavo de Carvalho, em sua coluna rotineiramente divertida, cheia de afirmações categóricas sem nenhum embasamento, afirmou que a Igreja Católica é o grupo humano com menor incidência de pedofilia. Aparentemente, ele não considerou em sua afirmação as Senhoras de Santana, que com certeza poderiam ser classificadas como humanas e que devem contar com intensa admiração do sr. Carvalho. A não ser que haja Senhoras de Santana pedófilas, o que eu sinceramente duvido.

Pelo visto, são necessárias muitas orações para baixar esse de 5% para 4%. Ou seria só uma flutuação estatística?


A porcentagem de 5% de pedófilos entre os professores me deixa perplexo. Imaginem que os números estejam corretos, que o estudo seja sério e que a realidade brasileira não seja tão diferente. Vamos imaginar que um aluno qualquer tenha, entre a primeira série e o nono ano, 20 professores diferentes (o que é um número modesto). Então, com nossa probabilidade de 5%, a chance desse aluno ter aulas com um professor que se interessa sexualmente por crianças e/ou adolescentes é de aproximadamente 64% (100%-(95%)20). Se essa probabilidade parecer estranha, consulte o chamado paradoxo do aniversário). Assustador.

No caso da Igreja, As coisas ficam ainda piores porque o Vaticano não lida bem com os casos e é basicamente um desastre em relações públicas. Vejam, eu também acho que relacionar os casos de pedofilia com celibato é algo meio estranho, meio como relacionar a proibição do uso de drogas com a quantidade de overdoses. Isso dito, relacionar pedofilia com homossexualidade, pra quem está se defendendo de acusações, é um erro gritante. Na verdade, pode até haver uma relação no sentido de que se possa fazer uma hipótese do tipo P1: A maioria dos pedófilos é homossexual. Mas o que o cardeal não deixa claro (e ele deveria ter estudado isso nas aulas de silogismos aristoteleanos) é que não é porque P1 é verdadeira que podemos afirmar que uma coisa cause a outra ou que, mais importante ainda, P1 tenha qualquer relevância nessa conversa. Por exemplo, a grande maioria dos pedófilos é homem, mas com certeza o cardeal entende porque não faria sentido dar uma entrevista falando da relação entre 'masculinidade e pedofilia' - Precisamos de menos padres e mais freiras!!! ou entre 'humanidade e pedofilia' (100% dos pedófilos são humanos, vejam só que estatística amedrontadora). O cardeal se esqueceu que também precisa da estatística de quantos homossexuais são pedófilos, e não só de quantos pedófilos são homossexuais.

Venham... só um pouquinho mais perto...


O problema se agrava ainda mais porque a Igreja, assim como praticamente todas as instituições religiosas do mundo, reivindica para si o monopólio absoluto sobre a moralidade humana. Como se defender, tendo colocado sobre si mesma padrões tão altos de comportamento? Isso sem contar os diversos casos de acobertamento e proteção a mando do alto clero ou até mesmo do próprio papa. Mas o escândalo não há de mudar nada; a Igreja já teve papa pedófilo (Julio III, acusado de manter uma relação esquisita com seu sobrinho adotivo), perseguição e assassinato de mulheres, venda de terrenos no céu, guerras em nome de Deus. Depois de tudo isso, não vão ser meia dúzia de padres subversivos que irão mudar a história.

5 comentários:

D disse...

Bateu forte.

Henrique Rossi disse...

Gostei da honestidade intelectual do texto!! hahaha Pobre papa.. O povo sempre o associando ao malévolo imperador de Star Wars...

Por acaso o estudo que diz que não há mais padres pedófilos do que homens adultos casados pedófilos está mencionado neste texto?

http://www.newsweek.com/id/236096/output/print

Mas ainda estou aqui tentando entender o "Bateu forte" da D.. O texto está ótimo porque simplesmente verdadeiro. Chamou-me especial atenção o seguinte parágrafo:

A porcentagem de 5% de pedófilos entre os professores me deixa perplexo. Imaginem que os números estejam corretos, que o estudo seja sério e que a realidade brasileira não seja tão diferente. Vamos imaginar que um aluno qualquer tenha, entre a primeira série e o nono ano, 20 professores diferentes (o que é um número modesto). Então, com nossa probabilidade de 5%, a chance desse aluno ter aulas com um professor que se interessa sexualmente por crianças e/ou adolescentes é de aproximadamente 64% (100%-(95%)20). Se essa probabilidade parecer estranha, consulte o chamado paradoxo do aniversário). Assustador.

Minha irmã psicóloga diz que 99% dos homens que ela atende foram violentados quando crianças.. Que fazer? É o ser humano em ação. Certamente fomos poupados de algum desses vampiros safados durante nossas infâncias. Mas não nos engamenos: ele estava lá, olhando-nos e desejando-nos.. Cruzes!!

Henrique Rossi disse...

Faltou dizer que tive uma namorada que, na infância, foi abusada sexualmente por um amigo íntimo de um tio.

Henrique Rossi disse...

André,

Até para compreender em maior profundidade este seu texto excelente, procurei ler o artigo do Olavo de Carvalho que você indicou. A bem da verdade, faz tempo que não o leio. Apesar de considerá-lo correto em muitas das suas colocações, ele é dado a certo grau de alarmismo que não me parece exatamente correto. De qualquer forma, pareceu-me extremamente corretas estas observações:

Por último, as influências intelectuais que vieram a dominar as faculdades de jornalismo, deprimindo a confiança nos velhos critérios de objetividade e enfatizando antes a função dos jornalistas como “agentes de transformação social”, acabaram transmutando maciçamente as redações em grupos militantes imbuídos de uma agenda político-cultural e dispostos a implementá-la por todos os meios.

Não minto quando digo que vi isso! Somente os alunos que tinham plena consciência disso que o Olavo menciona sentiam-se verdadeiramente bons. A turma dos "inteligentes" entendia isso com perfeição. E gabava-se diante dos colegas por toda a sua "enorme sapiência". Mas não é correto apenas dizer que vi isso. Àquela época eu era como eles. Eu era assim. Eu estudei Gramsci. Eu fui excelente aluno de sociologia. Eu fui um dos únicos a tirar 10 em sociologia. Da minha turma, fui certamente o único. Lembro-me bem porque um outro colega "concorria" comigo pelas melhores nota e, justamente em sociologia, eu o superei. Motivo pelo qual fiquei "me sentindo". Infelizmente nisto o Olavo está correto: as redações não estão mais preocupadas com a verdade - elas são apenas instrumentos de engenharia social com UM ÚNICO OBJETIVO: promover a revolução socialista. Para isto trabalham sem cessar as redações da Folha, do Estadão, do Globo, do Jornal do Brasil.. Esta é a verdade...

Henrique Rossi disse...

André, fiz umas considerações que achei bem interessantes no campo de comentários do Alea jacta est. São algumas respostas possíveis aos questionamentos que o Ariel levantou. Acho que sua participação poderia ser bastante legal. Até mais.