segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Zilda, a faxineira

Zilda nasceu nos confins de uma pequena cidade do Texas. Filha de um imigrante brasileiro com uma jovem texana, seu nome foi o único rompante de orgulho que seu pai demonstrou durante toda a vida. 'Vai chamar Zilda e acabou.'. A mãe, que normalmente tomava qualquer decisão baseada na simples negação da vontade do marido, dessa vez aceitou sem pestanejar. Pensou que talvez trouxesse destaque para a menina um nome assim, tão diferente.

E o destaque veio, mas não de forma agradável. Zilda sofreu deveras. Cilda pra cá, Cilda pra lá, fucking immigrant. Não sabia porque pronunciavam assim, talvez tenha sido uma mania que se espalhou. Fato é que não havia um único habitante da cidade que não a chamava de Cilda. Raça de gente idiota, ela pensava, não sabem nem falar essa merda de 'Z', tão fácil, qualquer criança consegue, gringos filhos da puta. Pra ela americanos iam sempre ser gringos, aqueles malditos, esquecia que ela também era dali.

Zilda queria o mundo, queria poder, queria dinheiro; nunca teve nada. Mas sua indignação era contida, tendo herdado boa parte da resignação do pai.

Aos dezesseis anos, Zilda começou a trabalhar como faxineira para uma vizinha. O resultado foi espetacular: sua fama de criteriosa, cuidadosa e esforçada se espalhou viralmente pela cidade, e logo ela estava faxinando para todas as grandes personalidades locais. Como na região havia uma grande base militar, logo Zilda tinha em sua carteira de clientes coronéis, majores e generais.

Em uma quinta-feira, enquanto cuidadosamente fazia a limpeza da coleção de moedas raras do general Curtis, Zilda foi interrompida em suas tarefas por uma pergunta inquietante: 'Você quer trabalhar na base, Cilda? O salário não é muito alto, mas o emprego é estável e o trabalho é pouco.'

Ela aceitou; não pelo pouco trabalho, não pela estabilidade - aceitou para estar ali, onde coisas aconteciam, onde podia sentir o cheiro do poder.

Dentro da base, devagar, ela foi subindo na complexa hierarquia da limpeza. Começou com pátios, banheiros. Passou para salas de instrução, depósitos de armas, salas de reunião. Em alguns anos estava faxinando as salas dos mais graduados oficiais da base.

Mas o que mudou radicalmente a vida de Zilda foi a rotina da limpeza mensal da sala de guerra. Ela se esbaldava com a sensação de importância: estar ali, onde as pessoas mais poderosas do mundo decidiam o destino de milhões. Era praticamente um ritual religioso; soldados de confiança a seguiam enquanto ela gentilmente esfregava seu paninho com álcool nas mesas, cadeiras, no painel cheio de luzes piscantes, nos monitores mostrando todas aquelas informações inacessíveis. Delicadamente acariciava com o pano o telefone vermelho, o bocal, as teclas. Limpar em torno daquele belo botão vermelho no centro do painel, cercado por avisos e coberto por um vidro, era praticamente um ato sexual.

O poder realmente a excitava.

Mas tudo passa e, depois de alguns anos, Zilda começou de novo a se acostumar com a situação, a se cansar da rotina. Um dia desses, acordou especialmente mal-humorada. Era dia cinco, dia de limpar a sala de guerra.

Resignada, foi ao trabalho. Resignada pegou seu balde, seus panos, seu esfregão.

No caminho, ainda na área aberta, encontrou o general Curtis, que pediu desculpas pela coca-cola que havia derrubado no carpete de uma das salas de instrução. Algum militar esquisito o estava acompanhando. Para Zilda, ele parecia russo. E daí que não fazia o menor sentido?

Ao ouvir o general pronunciando Cilda, o russo caiu no riso. 'Cilda, what a stupid name, hahaha.'. Ela sorriu, resignada.

No caminho pra sala de guerra, Zilda percebeu (ainda resignada) que sua importância era ilusória, e que só se sentia bem por estar perto de pessoas importantes. Concluiu que 'estar perto' não significava nada quando ela mesma não tinha poder nenhum. Toda a sua importância derivava dos generais, do telefone, do botão. Ela era um nada. Um nada resignado.

Limpou a sala devagar, como fazia todos os dias. Seus pensamentos vagavam. Ao sair, deixou os soldados irem na frente e bateu a porta. Correu, quebrou o vidro, apertou com força o botão vermelho no centro do painel.

'Quero ver algum filho da puta me chamar de Cilda agora.'

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Mais um round perdido

Acordo entre Brasil e Vaticano passa na Câmara

Criticado por amplos setores da sociedade, como a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o texto acabou aprovado em votação simbólica após a costura de uma negociação com a bancada evangélica, muito forte no Congresso, para estender os privilégios às demais religiões. O acordo seguirá agora para apreciação do Senado.

Mais gente pra aproveitar dos recursos infindáveis do nosso governo federal:

1. Ensino religioso nas escolas.
Qual é o problema de ensinar religião pras crianças na *igreja*? Eu já acho isso um pouco controverso, mas até aceito.

2. Isenção fiscal para rendas e patrimônios de pessoas jurídicas eclesiásticas. (Isso *pode* querer dizer que, por exemplo, uma editora ou um canal de TV comprado por uma igreja pode ter isenção de impostos)

[ironia]Como imposto é algo super bem administrado no Brasil, não acho que vá haver qualquer problema. Além disso, todas as religiões são profudamente morais em sua essência e nunca se aproveitariam de um benefício injusto.[/ironia]

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Nuvens


Sempre associei nuvens com sonhos, desde criança. Acho que pelo formato indefinido, elas ganham uma subjetividade muito interessante. Você pode ver coelhinhos, cachorros, dentistas, tudo o que quiser. E os sonhos, claro, você também pode interpretá-los da maneira que achar melhor.

Hoje estava me lembrando de uma tarde de acampamento na minha adolescência. Eu e dois amigos fomos até Monte Verde, MG, e estávamos acampando ilegalmente - já que é proibido ficar na montanha, por conta do pessoal que faz fogueira, deixa sujeira, etc. Era o quarto dia de acampamento isolado e estávamos sujos, cansados e com fome. É muito exercício pra quem pouco fazia fora ir da casa pra escola e da escola pra casa.

Antes de irmos embora, faltava o último lugar a ser visitado, o Pico do Selado. Tem uma foto legal da vista dele aqui. Estávamos, se não me falha a memória, em um outro pico chamado Chapéu do Bispo, e para ir de um ponto a outro havia duas alternativas: descer até o córrego, pegar água, e fazer o caminho de volta; ou ir pelas montanhas, percorrendo uma distância menor, sem água por perto.

Estávamos com os cantis vazios, mas resolvemos ir direto já que isso economizaria um bom tempo de caminhada. A subida foi marcada pelo arrependimento constante. Parece pouco, mas duas ou três horas andando em terreno íngreme e acidentado, carregando peso... não é moleza. O tempo estava terrivelmente nublado, ameaçando chover. A sede atrapalhava e fazia as mochilas pesarem ainda mais. O que cada um pensava era 'Porcaria, devíamos ter ido pra casa, que droga isso.'.

Apesar dos problemas, continuamos até o fim. E, no cume do morro, tive uma das visões mais maravilhosas da minha vida - ventava muito, e as nuvens contornavam a montanha imediatamente abaixo de nossos pés. Se você ficasse abaixado, só veria neblina; mas quando se levantava, via um gigantesco colchão branco, até onde a vista alcançava, voando numa velocidade impressionante e caprichosamente dando a volta em torno de onde estávamos.

É uma pena que eu não tenha levado uma máquina fotográfica. Mas, mesmo se tivesse, a experiência de estar ali naquela hora é intransferível.

No dia seguinte, já na cidade, ficamos totalmente desesperados por ter perdido o ônibus, já que só haveria outro horário no dia seguinte. Um sujeito de fusca notou nossa preocupação e, sem pedir absolutamente nada em troca, perseguiu o ônibus até fazer ele parar. Repito: o rapaz perseguiu e parou um ônibus para ajudar a três moleques desconhecidos, sujos, sem banho, isolados no meio do mato há mais de 4 dias.

Sempre vou ser grato àquele cara.

Sem palavras.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Fenômenos inexplicáveis...

...ou melhor, que ainda não foram explicados.

Semana passada vi aqui uma listinha de fenômenos naturais que ainda não foram explicados. Hoje vi um post no Wired de mais um desses fenômenos, bem interessante... nuvens tubulares que aparecem em uma pequena cidade da Austrália todo outono:



Coisa mais bonita, não?

Mais um item pra minha lista de coisas pra fazer quando me tornar um milionário excêntrico.

domingo, 23 de agosto de 2009

Krishnas

Li hoje uma passagem muito interessante sobre o pensamento dos Hare Krishnas sobre a Teoria da Evolução e Ciência em geral:
Aqui ou aqui. (O primeiro link é mais confiável, o segundo mais completo e vai direto ao ponto).

Passagens interessantes:

Srila Prabhupada: Isso é ridículo. [...] Você diz 'evidência histórica', mas onde está sua evidência? Não há como contar uma história de mais de 3 mil anos atrás, e você está falando de 500 milhões de anos. Isso não faz sentido.

Devoto: Mas se você cavar o chão, camada por camada...

Srila Prabhupada: Da poeria você calcula 500 milhões de anos? Poderiam ser dez anos. Não há como contar a história da sociedade humana há mais de três mil anos atrás, então como é que você está falando de quatrocentos ou quinhentos milhões de anos? Onde você estava nesse dia? Você estava lá, pra dizer que todas essas espécies [que vemos hoje] não estavam lá? É imaginação. Desse jeito qualquer um pode imaginar e dizer o que quiser.

...

Srila Prabhupada: Conhecimento experimental é sempre imperfeito, porque você experimenta com seus sentidos imperfeitos. Portanto, o conhecimento científico é imperfeito. Nossa fonte de conhecimento é diferente. Não dependemos de conhecimento experimental.

Você não vê os dinossauros, nem eu vi todos os 8.400.000 tipos de vida [segundo o livro sagrado]. Mas nossa fonte de conhecimento é diferente. Nós adquirimos o conhecimento da pessoa perfeita, que viu tudo, que sabe tudo. Portanto, nosso conhecimento é perfeito.


Em outras palavras: fodam-se as evidências, fico com o meu livro (o que me fez lembrar imediatamente de um outro pessoal). A diferença é que no livro sagrado dos Krishnas existem 8.400.000 tipos de vida, nem uma a mais, nem uma a menos, espalhados pelas galáxias - e elas não mudam, não evoluem, nunca. Ah, e o ser humano habita o planeta há bilhões de anos (a discussão começa sobre registros de fósseis de homo sapiens que vão no máximo a 250 mil anos atrás).

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Acidentes científicos

Volta e meia lembro da feliz história sobre a invenção da penilicina... diz-se que o Fleming esqueceu por acidente uma cultura de estafilococos ao ar livre e percebeu que um mofo estava atrapalhando o crescimento das bactérias. E esse tal mofo iniciou a era dos antibióticos, que tanto aumentou a expectativa de vida humana no último século.

Mas nem todos os acidentes são agradáveis.

Na noite 21 de agosto de 1945, Harry Daghlian, um físico de 24 anos, estava fazendo hora extra no Projeto Manhattan (aquele mesmo da bomba atômica). Ele estava desrespeitando regras do regulamento de segurança, trabalhando sozinho tarde da noite. Aliás, pensando bem, mexer com plutônio durante as horas extras não me parece mesmo muito indicável.

Daghlian estava calmamente adicionando 'refletores de neutrôns' de tungstênio (com formato de blocos) em torno de uma massa de plutônio - o coração de uma bomba atômica. Refletores de neutrôns não são radioativos, mas diminuem a quantidade de plutônio necessária para gerar uma explosão (para usar o termo mais científico, massa crítica).

Ao aproximar o último bloco refletor de neutrôns do núcleo de plutônio, Daghlian viu pelos instrumentos que seria alcançada a massa crítica. Ele ficou desesperado e tentou afastar o bloco - por sinal bem pesado -, que acabou caindo exatamente em cima do plutônio. Surgiu do plutônio algo que foi descrito como 'um brilho azul', e Daghlian tirou o bloco que havia caído com as próprias mãos. Ele morreu 21 dias depois devido à radiação.

Algum tempo depois, um colega de Daghlian chamado Louis Slotin, de 35 anos, estava demonstrando a alguns alunos como montar um experimento para calcular a massa crítica de determinada quantidade de plutônio. Ele estava usando uma chave de fenda (!!!) para separar dois hemisférios de berílio que, juntos, fariam o conjunto alcançar massa crítica (o berílio também funciona como refletor de neutrôns, assim como grafite). Em determinado momento, a chave de fenda escapou e o hemisfério superior se juntou ao inferior, fazendo o conjunto alcançar massa crítica. Slotin imediatamente separou as esferas (salvando todos os estudantes da sala e talvez muitas outras pessoas), mas ele já havia recebido muita radiação e morreu nove dias depois.

Era o mesmo núcleo de plutônio, por sinal. Ele foi apelidado de 'Demon core'.

Em 1978, um cientista chamado Anatoli Bugorski estava, na Rússia, trabalhando em um acelerador de partículas pifado. Ele estava com a cabeça dentro do espaço por onde passam os feixes de prótons quando um dispositivo de segurança falhou e o acelerador foi colocado em funcionamento. Pois bem, o cara estava com a cabeça literalmente dentro do acelerador de partículas.

Acredita-se que uma exposição a 5 ou 6 rads é suficiente para matar uma pessoa; Bugorski recebeu 2000 rads. O lado esquerdo de seu rosto inchou de forma que ele ficou irreconhecível; a pele e o tecido no local atingido caíram, deixando visíveis o osso e a região do cérebro por onde passou o feixe. Todo o tecido cerebral por onde os raios passaram morreu. No entanto, Bugorski sobreviveu e até terminou seu doutorado. O lado esquerdo de seu cérebro não funciona, mas ele é capaz de trabalhar normalmente - com exceção de habituais ataques epilépticos que passou a ter depois do acidente.

Essa é das boas

Quantos surrealistas são necessários pra trocar uma lâmpada?
- Cavalo.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Estado laico e esperneios diversos


Causou um certo movimento na blogosfera católica um texto do juiz protestante William Douglas sobre a retirada de crucifixos de repartições públicas.

A princípio se esperaria que o juiz, por ser protestante, se colocasse como favorável à retirada dos 'ídolos' das repartições públicas. No entanto, Douglas defende a permanência dos símbolos com unhas e dentes (claramente com um objetivo de segundo plano). Vamos ao texto:

O Estado é laico, isso é o óbvio, mas a laicidade não se expressa na eliminação dos símbolos religiosos, e sim na tolerância aos mesmos.


Errado duas vezes. Em primeiro lugar, William redefine o termo e acredita que com essa redefinição resolve o problema. Normalmente, se define o estado laico como 'aquele em que não há envolvimento religoso nos assuntos de Estado e não há envolvimento estatal nos assuntos religiosos' - a 'tolerância' aos símbolos deve acontecer, obviamente, mas fora da esfera do que é público. Em segundo lugar, se o que ele disse estivesse correto, então absolutamente todas as religiosidades possíveis deveriam estar representadas - não apenas o crucifixo cristão. Eu quero uma foto do Monstro do Espaguete Voador.

O próximo passo será proibir também os símbolos na mesa de trabalho, seja porque o ambiente pertence ao serviço público, seja porque em tese poderia ofender algum colega que visualizasse o símbolo.


A ação é a favor da retirada de objetos religiosos de locais de atendimento público, ponto. Nada mais do que isso.

O crucifixo nas cortes, independentemente de haver uma religião que surgiu do crucificado, é uma salutar advertência sobre a responsabilidade dos tribunais, sobre os erros judiciários e sobre os riscos de os magistrados atenderem aos poderosos mais do que à Justiça.


Argumento ridículo. Vamos colocar então a imagem do Pedrinho da história do lobo para ninguém cometer perjúrio no tribunal. A escolha do símbolo é obviamente por conta da religiosidade e é assim que a ideia tem que ser debatida.

Vale dizer que se a medida for ser levada a sério, deveríamos também extinguir todos os feriados religiosos, mudar o nome de milhares de ruas e municípios e, ad reductio absurdum, demolir simbolos e imagens, a exemplo, que identificam muitas das cidades brasileiras, incluindo-se no cotidiano popular de homens e mulheres estratificados em variados segmentos religiosos.


Errado. Ninguém quer extender a medida para destruir símbolos ou imagens. Da mesma forma, posso argumentar que manter símbolos religiosos em repartições públicas vai levar à uma situação em que o Estado vai obrigar todos a usarem os tais símbolos. É a mesma lógica. No entanto, concordo quanto aos feriados religiosos; deviam mesmo ser abolidos.

E agora ele se revela:

Todos se recordam do lamentável episódio em que um religioso mal formado chutou uma imagem de Nossa Senhora na televisão. Se é errado chutar a imagem da santa, não é menos agressivo querer retirar todos os símbolos. Não chutar a santa, mas valer-se do Estado para torná-la uma refugiada, uma proscrita, parece-me talvez até pior, pois tal viés ataca todos os símbolos de todas as religiões, menos uma. Sim, uma: a “não religião”, e é aqui que reside meu principal argumento contra a moda de se atacar a presença de símbolos religiosos em locais públicos.


Ninguém quer proibir imagem alguma, ninguém quer transformar a tal santa numa proscrita, ninguém quer chutá-la. Douglas transforma seus antagonistas em um espantalho extremamente mal acabado e bate nele como se estivesse batendo no original.

A ideia é tão ruim que é até difícil refutá-la. O juiz mostrou, com esse parágrafo, que não tem absolutamente nenhuma noção do que significa o conceito da laicidade do Estado. A ausência de símbolos religiosos não quer dizer que o Estado vai passar a ser ateu - vai passar apenas a ser 'areligioso', respeitando a religiosidade (ou não) de cada um dos cidadãos.

A recusa à existência de Deus, a qualquer religião ou forma de culto a uma divindade não é uma opção neutra, mas transformou-se numa nova modalidade religiosa.


De onde tirou isso? Douglas erra ao inferir (como muitas outras pessoas fazem) que a 'não-religião' também é uma religião. Eu gosto do exemplo do time de futebol; alguém pergunta pra qual time você torce, ao que você responde: 'Nenhum, não gosto de futebol.'. E aí o juiz, do alto de sua erudição, replica: 'Você gosta sim de futebol, você só tem um não-time.'.

E mesmo que você tente espalhar o seu 'não-gosto' por futebol para seus amigos, isso não vai fazer da sua opção um novo estilo de 'gosto por futebol'. Não vou me alongar nessa discussão, pois o assunto já foi abordado de maneira brilhante em vários lugares.

Agora vem a melhor parte:

Interessante perceber que esta linha de ateus é intolerante e, como foi historicamente comum em todas as religiões iniciantes ou pouco amadurecidas, mostrou-se virulenta e desrespeitosa no ataque às demais. Esta nova religião, a “não religião”, ao invés de assumir o controle ou titularidade da representação divina, optou por entender que não existe Deus nenhum. Em certo sentido, ao eliminar a possibilidade de um ser superior, assumiu o homem como o ser superior. Aqui o homem que professa tal tipo de crença não é mais o representante de Deus, mas o próprio ser superior. Nesse passo, a nova religião tem outra penosa característica das religiões pouco amadurecidas, consistente na arrogância e prepotência de seus seguidores, apenas igualada pelo desprezo à capacidade intelectual dos que não seguem a mesma linha de pensamento.


Aqui Douglas esqueceu-se totalmente da razão de ter começado o artigo e mostrou a que veio realmente: ele quer atacar os ateus. Eu nunca diria que todos os ateus são tolerantes (assim como muitos crentes não o são), mas daí a dizer que o ateísmo leva à arrogância é mostrar total desconhecimento do assunto. A absoluta maioria dos ateus que eu conheço é profundamente humilde nas questões universais e só defende seus pontos de vista utilizando argumentos racionais.

E, por mais que o juiz não concorde, o ateísmo não tem profetas. O que pode existir são expoentes - o que é muito, muito diferente. Mas também não vou cair nessa discussão.

O que eu acredito que tenha irritado Douglas é que os ateus normalmente discutem ideias religiosas da mesma maneira que discutem quaisquer outras ideias (afinal, não tem como ser de outro jeito, já que para eles a religião é um assunto puramente material). Isso ofende algumas pessoas crentes, mas não são os ateus que estão errados. Como já disse Douglas Adams, o maravilhoso escritor do Guia do Mochileiro das Galáxias:

"A religião [...] tem determinadas ideias em seu cerne que denominamos sagradas, santas, algo assim. O que isso significa é: 'Essa é uma ideia ou uma noção sobre a qual você não pode falar mal, simplesmente não pode.' [...] Se alguém vota em um partido com o qual você não concorda, você pode discutir sobre isso o quanto quiser; todo mundo terá um argumento, mas ninguém vai se sentir ofendido. Se alguém acha que os impostos devem subir ou baixar, você pode ter uma discussão sobre isso. Mas se alguém disser: 'Não posso apertar o interruptor da luz no sábado', você diz: 'Eu respeito isso'."

Religião é um assunto como qualquer outro e pode sim ser debatido normalmente.

O principal profeta dessa religiosidade invertida (mas nem por isso deixando de ser uma manifestação religiosa) é Richard Dawkins, autor do livro “Deus, um Delírio”. Ele está envolvido, como qualquer profeta, na profusão de suas ideias, fazendo palestras e livros, concedendo entrevistas e fazendo suas “cruzadas”.


E o que há de errado com isso? Ele não pode transmitir o seu 'desgosto por futebol' para outras pessoas? Isso é intrinsecamente ruim?

Agora vem a desonestidade flagrante. Douglas, ao querer citar Dawkins como um agressivo ateu, atribui a ele as seguintes palavras:

Por exemplo, em seu livro, ele diz sobre Madre Teresa o seguinte: “(...) Como uma mulher com um juízo tão vesgo pode ser levada a sério sobre qualquer assunto, quanto mais ser considerada seriamente merecedora de um Premio Nobel? Qualquer um que fique tentado a ser engabelado pela hipócrita Madre Teresa (...)” (pág. 375).


O que ele esqueceu foram das frases que vieram imediatamente anteriores a essas:

"A contemplação de embriões parece ter mesmo um efeito extraordinário sobre muitas pessoas de fé. Madre Teresa de Calcutá chegou a dizer, em seu discurso ao receber o Prêmio Nobel da Paz: "O maior destruidor da paz é o aborto.". Como uma mulher com um juízo tão vesgo... etc etc.

E depois Dawkins ainda cita o livro (extremamente crítico) de Hitchens sobre a tão famosa Madre (que, por sinal, pode ter sido atéia!). Não é o caso aqui de defender ou não o aborto; mas concordo plenamente com Dawkins que afirmar que o maior destruidor da paz é o aborto é absolutamente imbecil.

Repito: desonestidade flagrante da parte de W.D. Que coisa feia pra alguém tão preocupado com a moral e a justiça, não é mesmo?

Segue-se um bla bla bla sobre ditadura da minoria sobre a maioria, etc. O problema é que nesse caso a minoria não deseja impor à maioria um comportamento qualquer; deseja apenas que seu direito de ter um Estado laico seja respeitado. Em sua casa, o juiz pode ter quantos crucifixos quiser, mas não no Tribunal.

A impressão que eu fiquei ao ler o texto é que o tal Douglas comprou a briga dos católicos por ver nela uma possibilidade de bater nos ateus. Talvez no fundo ele acredite que a Igreja Católica não seja uma ameaça para o protestantismo (eles já estão acostumados há muito tempo com a Igreja Católica no Brasil) e que a vitória de um movimento racional fosse mais danosa às religiões em geral. Bem possível.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Beliefs



Do xkcd.

domingo, 9 de agosto de 2009

Relativização

Kennedy Alencar me fez ter arrepios ao comparar a Marina Silva ao Barack Obama. Qual é a semelhança? A política ambiental? E quantas áreas políticas existem (e que devem ser levadas em conta) ao se analisar um eventual candidato à presidência?

Obama,em seu discurso de posse, disse que os EUA são uma nação de cristãos, muçulmanos, judeus, hindus e também de pessoas de nenhuma fé. Disse depois que a nação em si não tem nenhuma fé específica, e que, por isso, os EUA não são uma nação cristã (nem muçulmana, nem judia). É preciso coragem para afirmar isso lá.

Marina Silva é adventista e criacionista. Ela inclusive defende o ensino do criacionismo em escolas públicas (ensinar o quê? Afinal, Deus fez tudo num estalar de dedos) - o que também indica que ela é tendenciosa, crédula, ignorante, mal informada, não entende a distinção entre religião e Estado e é provavelmente burra. Marina faz parte da laia de governantes que confunde o público com o privado. O que, por sinal, não é de forma alguma 'revitalizante', como disse Kennedy Alencar.

Para melhor ilustar a minha opinião sobre a candidatura dela, vou demonstrar através de uma série de disputas contra outros possíveis candidatos, selecionando em qual dos dois eu daria meu voto.

Tentativa 1:


Para começar, uma disputa difícil. Maluf é um corrupto notório, já foi preso, está enterrado em um mundo de denúncias. Acho que a resposta correta para uma possível disputa de presidência entre os dois seria 'Canadá'.

Tentativa 2:


Outro problema insolúvel, acredito. Mas o Serra foi bem efetivo no Ministério da Saúde; fico com ele, a contragosto.

Tentativa 3:


Fácil, fácil. Por mim, a barra de carvão inanimada ganharia ainda no primeiro turno.

sábado, 8 de agosto de 2009

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Jogo de primeira pessoa...

...com armas reais.


E o pior: é realmente coisa de texano!

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Diálogo besta

- Então o tal cliente se chama Richarlyson? Hahaha, você vai lá atender o Richarlyson é?

- Não... acho que é Ricarlison... algo assim.

- Ricarlison? Bom, Ricarlison é muito menos gay do que Richarlyson, não é?

- Hm... é, talvez. Mas o que é gay, gay de verdade, é dar a bunda, não? O cara pode ter o nome que quiser, não importa. Pode chamar até... sei lá, Conan. Se der a bunda, vai ser gay do mesmo jeito.

- Hahahaha, já pensou, um casalzinho de homem de mão dada na rua e um deles se apresenta dizendo 'Eu sou o Conan.'? Hahaha!

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Avalanche de informação



Sempre acreditei que é mais fácil ter um ponto de vista crítico quanto mais informação você possua. Com essa bagunça que está o noticiário por conta da gripe suína, percebi que, em alguns casos, mais informação só dificulta as coisas.

O correto, eu acredito, seria ignorar absolutamente _todas_ as opiniões que não sejam embasadas em fontes que tenham um mínimo de credibilidade. No entanto, é difícil deixar de ler todos aqueles comentários (absolutamente idiotas em sua maioria) das notícias da Folha Online. É difícil passar sem ficar pensando que em alguns deles deve haver alguma verdade e ficar tentando filtrar - o que é mais idiota ainda.

O pior, o pior de tudo, é que os grandes jornais brasileiros entraram na onda e perceberam que fomentar o pânico é uma boa fonte de hits (ou talvez já soubessem disso há muito tempo? Sinceramente não sei).

O fato de não poder contar nem com o público geral (que está totalmente desesperado) nem com a grande imprensa (que está obviamente interessada em vender mais jornais e ganhar mais pageviews) nos deixa num beco sem saída. Com o desespero generalizado, questionar uma ou outra ação do Ministério da Saúde (com base nas atitudes de outros países) acaba fazendo você se soar como mais um 'chapéu de alumínio' na multidão.