quarta-feira, 9 de julho de 2014

8 de julho


Hoje li no twitter que a única lição que o futebol ensina é que não há nenhuma lição nele a ser aprendida, que ele é absurdo e hermético, que não serve como metáfora para nada. Não concordo e acho que, conceitualmente, qualquer coisa pode ser metáfora para qualquer outra coisa. Basta o ângulo certo, a visão mais apurada, um observador coerente. Como em "Muito além do jardim", até ideias muito simples se prestam a explicar raciocínios elaborados.

No Facebook, a Renata compartilhou o poema em linha reta, do Fernando Pessoa, muito apropriado ao dia de hoje:

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Hoje fomos ridículos. Estávamos no palco do baile de formatura, esperando a coroa, e fomos atingidos pelo balde de tripas de porco. Há uma certa beleza irônica, uma inversão do "pão e circo" tão repetido pelos antitorcedores de facebook. Se há um circo, hoje fomos os palhaços.

A paixão por futebol nos faz esquecer dos outros problemas, nos deixa mais alienados, mais crédulos e idiotas - mas também pode mostrar de forma drástica a nossa falibilidade. Nossa mortalidade. Mostra que nossa pompa não tem nada de realista. Se no futebol pensamos que somos grandes, também é no futebol que nossa grandeza foi esmigalhada diante de nossos olhos, pro mundo inteiro ver.

E como em todo espelho, não é destruindo o reflexo que se destrói o objeto. Acordaremos ridículos, amanhã e depois, e muitas outras vergonhas e alegrias viveremos na vida e no futebol.

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